Cashback, de Sean Ellis
Cashback é uma gíria para uma mutreta inglesa pouco conhecida em terras brasileiras: a prática de, ao passar um compra no cartão, pedir para o caixa da loja debitar um valor mais alto da mercadoria, e receber dele de volta o valor excedente. Um jeitinho pra conseguir um dinheiro vivo e gastar como quiser.
O filme homônimo do diretor britânico Sean Ellis parece obedecer a uma lógica parecida. Ao encher seu filme de efeitos e manipulações da imagem, parece acreditar que obterá em retorno alguma espécie de troco, no caso o respaldo crítico. Bem longe disso, o filme parece se enquadrar perfeitamente no tipo de cinema que Luiz Carlos Oliveira Jr. define como ''publicitário''. Nele, menos do que a mensagem em si, o que importa é a clareza e efetividade com que esse conteúdo é repassado; usar um recurso de maneira a atingir o resultado esperado, nunca preocupar-se em realmente criar algo que dê para o espectador a responsabilidade de tentar decodificar.
O excepcional tratamento de som, quase sempre limpo, sem trilha sonora, dá um interessante tom de assepsia interessante ao filme, que se passa quase todo em madrugadas dentro de um supermercado, além de ter uma forte narração em off do personagem principal, mas não consegue esconder a total falta de sustentação do argumento central da película.
A história, resumidamente, é a de um estudante de artes plásticas que depois do fim de seu relacionamento com a namorada começar a passar as noites insones refletindo sobre o que levou ao fim do relacionamento. Resolve então usar as horas a mais acordadas para ganhar um dinheiro extra trabalhando no supermercado, e acaba descobrindo que, para enganar o tédio, tem o poder de paralizar o tempo. O filme tem efeitos arrojados, tanto nas cenas em que os personagens ficam congelados no espaço ao comando do pensamento do personagem principal, quanto nas transições de cena em que um cenário se liga diretamente com o outro, sem que haja conexão espacial real entre eles.
Os personagens, entretanto, nunca chegam perto de serem críveis nem muito menos interessantes. Pelo contrário, agem como que forçados por um manual de roteiro a mudar de atitude em rompantes de forma a atender a necessidade arbitrárias de viradas no roteiro em momentos calculados. O capricho da parte técnica do filme chega a dar um tom interessante à narrativa, uma embalagem que chega a cheirar a ''cinema de arte'', por mais problematizável que seja o termo. Mas a película acaba se aproximando mais, e mal, com o gênero da comédia romântica, o que não é um problema em si, se este não fosse um péssimo exemplar do estilo. Isso sem falar dos patéticos momentos em que tudo degringola para o mais típico besteirol americano, na péssima sequência do jogo de futebol entre os funcionários da empresa em que o personagem principal trabalha.
Não sei até que ponto minha frustração com o filme veio de esperar dele alguma coisa a mais encorpada, pelo próprio auê feito em torno dele - o curta homônimo que deu origem ao filme, Cashback, ganhou o Oscar de melhor curta-metragem em 2003. Mais um sinal de pouca inventividade, o cineasta simplesmente rodou mais sequências e enxertou o curta, inteiro, do mesmo jeito que estava, no meio do longa que criou. E o pior, os momentos mais interessantes do filme acabam sendo justamente o fragmento pré-existente, onde os problemas citados, talvez pelo menor tempo, são bem menos evidentes.
Vi o filme na última quarta, na primeira sessão mobilizada pelo site Movie Mobz em que fui. A sala estava razoavelmente lotada para um dia de meio da semana, o que me fez acreditar que a idéia de marcar sessões pela internet pode realmente dar certo. A sessão começou na hora, a projeção, feita a partir de um arquivo digital enviado por satélite funcionou direitinho, sem falar do horário, 19h, surpreendentemente mais cedo do que o habitual, que costumava ser 21h. Só falta mais gente participar, e escolher filmes mais bacanas.
ps: consertei o link do curta.
***
Em breve teremos mais gente escrevendo aqui. O Petrus, que já consta a um tempona lista de colaboradores ali ao lado, deve estrear no Iguatu com uma crítica sobre o filme Ossos, de Pedro Costa, e vai contribuir regularmente pro site. Aguardem!
Cashback é uma gíria para uma mutreta inglesa pouco conhecida em terras brasileiras: a prática de, ao passar um compra no cartão, pedir para o caixa da loja debitar um valor mais alto da mercadoria, e receber dele de volta o valor excedente. Um jeitinho pra conseguir um dinheiro vivo e gastar como quiser.
O filme homônimo do diretor britânico Sean Ellis parece obedecer a uma lógica parecida. Ao encher seu filme de efeitos e manipulações da imagem, parece acreditar que obterá em retorno alguma espécie de troco, no caso o respaldo crítico. Bem longe disso, o filme parece se enquadrar perfeitamente no tipo de cinema que Luiz Carlos Oliveira Jr. define como ''publicitário''. Nele, menos do que a mensagem em si, o que importa é a clareza e efetividade com que esse conteúdo é repassado; usar um recurso de maneira a atingir o resultado esperado, nunca preocupar-se em realmente criar algo que dê para o espectador a responsabilidade de tentar decodificar.
O excepcional tratamento de som, quase sempre limpo, sem trilha sonora, dá um interessante tom de assepsia interessante ao filme, que se passa quase todo em madrugadas dentro de um supermercado, além de ter uma forte narração em off do personagem principal, mas não consegue esconder a total falta de sustentação do argumento central da película.
A história, resumidamente, é a de um estudante de artes plásticas que depois do fim de seu relacionamento com a namorada começar a passar as noites insones refletindo sobre o que levou ao fim do relacionamento. Resolve então usar as horas a mais acordadas para ganhar um dinheiro extra trabalhando no supermercado, e acaba descobrindo que, para enganar o tédio, tem o poder de paralizar o tempo. O filme tem efeitos arrojados, tanto nas cenas em que os personagens ficam congelados no espaço ao comando do pensamento do personagem principal, quanto nas transições de cena em que um cenário se liga diretamente com o outro, sem que haja conexão espacial real entre eles.
Os personagens, entretanto, nunca chegam perto de serem críveis nem muito menos interessantes. Pelo contrário, agem como que forçados por um manual de roteiro a mudar de atitude em rompantes de forma a atender a necessidade arbitrárias de viradas no roteiro em momentos calculados. O capricho da parte técnica do filme chega a dar um tom interessante à narrativa, uma embalagem que chega a cheirar a ''cinema de arte'', por mais problematizável que seja o termo. Mas a película acaba se aproximando mais, e mal, com o gênero da comédia romântica, o que não é um problema em si, se este não fosse um péssimo exemplar do estilo. Isso sem falar dos patéticos momentos em que tudo degringola para o mais típico besteirol americano, na péssima sequência do jogo de futebol entre os funcionários da empresa em que o personagem principal trabalha.
Não sei até que ponto minha frustração com o filme veio de esperar dele alguma coisa a mais encorpada, pelo próprio auê feito em torno dele - o curta homônimo que deu origem ao filme, Cashback, ganhou o Oscar de melhor curta-metragem em 2003. Mais um sinal de pouca inventividade, o cineasta simplesmente rodou mais sequências e enxertou o curta, inteiro, do mesmo jeito que estava, no meio do longa que criou. E o pior, os momentos mais interessantes do filme acabam sendo justamente o fragmento pré-existente, onde os problemas citados, talvez pelo menor tempo, são bem menos evidentes.
Vi o filme na última quarta, na primeira sessão mobilizada pelo site Movie Mobz em que fui. A sala estava razoavelmente lotada para um dia de meio da semana, o que me fez acreditar que a idéia de marcar sessões pela internet pode realmente dar certo. A sessão começou na hora, a projeção, feita a partir de um arquivo digital enviado por satélite funcionou direitinho, sem falar do horário, 19h, surpreendentemente mais cedo do que o habitual, que costumava ser 21h. Só falta mais gente participar, e escolher filmes mais bacanas.
ps: consertei o link do curta.
***
Em breve teremos mais gente escrevendo aqui. O Petrus, que já consta a um tempona lista de colaboradores ali ao lado, deve estrear no Iguatu com uma crítica sobre o filme Ossos, de Pedro Costa, e vai contribuir regularmente pro site. Aguardem!
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