fim de mundo com lan-house

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segunda-feira, 24 de agosto de 2009

8 perguntas para Alan Santiago


Alan Santiago é um jovem estranho. Aos 19 anos ganhou o edital da Secult de literatura para publicação de um livro, sua primeira produção, A Lua de Ur num Prato de Terra, que só recentemente chegou as livrarias da cidade. No dia 7 de julho, no pátio anexo do Theatro José de Alencar, figuras como Pedro Salgueiro, Tércia Montenegro estavam lá prestigiando nosso jovem escritor, hoje aos 21 anos de idade, prestes a se formar e trabalhando no jornal O Povo como estagiário do Núcleo de Cultura e Entretenimento.


Alan se fazendo a fatídica pergunta: porque escritor só tira foto com livros?

O conheci há bastante tempo. Para ser sincero, somos colegas de turma de faculdade, mas na verdade nos conhecemos um pouco antes de pisarmos na UFC: graças à internet, começamos a nos comunicar muito antes do início das aulas. Nessa época, li muitos dos contos que hoje se encontram no livro. Lembro que havia quase um conto novo por semana para ler em seu blog, frequência que era quase a mesma com que eu produzia ainda alguma coisa. Mas talvez já naqueles dias, mesmo sendo muito fácil dizer isso a essa altura, eu já soubesse que ele provavelmente iria mais longe dentre todos nós. Não falo por ter ganho o edital ou lançado o livro, mas pela simples e fulminante paixão necessária para montar e acreditar em um livro próprio.

Paixão essa, aliás, que pode ser sentida nos contos de A Lua de Ur: tanto em sua escrita galopante e ausência de fôlego típica dos amantes, ao próprio enredo onde é possível sentir o sangue escorrer das mais incautas frestas dos relacionamentos e do cotidiano.

Resolvi fazer uma experiência notion less e, pela primeira vez, entrevistar um amigo, e posto aqui o resultado dessa entrépida aventura, que planejo repetir mais vezes. Por isso, amigos, lancem livros(filmes, peças e exposições também estão valendo)!

*O negrito sou eu. O normal é o Alan.

Copiando a pergunta para a qual nunca fiquei sabendo da resposta, de um veículo bahiano que não lembro agora: quem neste mundo de deus botou a literatura na sua cabeça? Foi sua tia que lhe deu a máquina de escrever? Ou começou muito antes?

Minha tia tinha duas máquinas de escrever. Uma pequena, azul, portátil, com tinta preta e às vezes vermelha, que ela guardava numa maleta de formato estranho com aba de plástico para carregar. A outra era elétrica – coisa que no início dos anos 1990 era a consubstanciação da modernidade, mas que ainda se tremia quando ligada. Mesmo assim não era preciso quase nem fazer força para digitar. Foram nessas duas máquinas que escrevi meus primeiros contos, na grande casa da família, onde meu pai mora solitário ainda hoje. Mas, se eu for pensar bem, nunca tive nenhum incentivo formal. Meu pai não me ensinou, usando o tabuleiro de xadrez, os paradoxos de Zenon de Eléia como fez o pai do Borges quando ele tinha quatro anos de idade. Lá em casa nunca teve uma biblioteca vasta – embora sempre tenha visto minha mãe lendo. Meus passeios não eram na livraria, nem meus brinquedos eram livros. Sempre fui muito solitário. Isso deve ter sido um motivo, quem sabe. Não posso dizer ao certo, mas o fato é que comecei a ler e escrever ainda em tenra idade, ficções de suspense, de crimes inexplicáveis, aventuras. É uma biografia que, diferente das histórias que tento contar, não tem muitos acontecimentos.

Olhando para o lado

Quem primeiro te impressionou? Garcia Márquez? Agatha Christie? E quem ainda te impressiona?

Primeiro foi, sem dúvidas, os livros infanto-juvenis do Marcos Rey, na Coleção Vagalume. Essa coleção formou gerações de leitores nas décadas de 1980 e 1990. Depois vieram os crimes aparentemente insolúveis de Agatha Christie. Pouco mais tarde, veio Clarice Lispector, Graciliano Ramos, Gabriel Garcia Márquez e assim começaram minhas leituras mais sérias. Acredito que todas as literaturas que são de verdade conseguem continuar impressionando e incomodando mesmo muito tempo após serem lidas. Não é diferente com Márquez, Graciliano...

Alguém que você gostava muito hoje você vê com outros olhos? Aliás, creio que isso é algo que sempre acontece... talvez seria melhor perguntar: o que na literatura você foi descobrindo que podia parecer legal, mas nem era? Em relação a recursos, temas, etc.

Pensei, por um tempo, que o ser humano só poderia estar nu, revelado, na arte, através da literatura, se fosse por meio dos fluxos da consciência. Só assim alguém estaria diante do que realmente é um homem e como ele organiza seus processos mentais. Me enganei. E de maneira retumbante. Trata-se apenas de um dos recursos possíveis para tentar desvendar a vida. A literatura lhe oferece outros tantos, porque o mundo oferece igualmente tantas possibilidades quanto sejam os homens e suas formas de se relacionar, construir significado para o mundo. É evidente que essa descoberta me fez enxergar não a literatura, mas as literaturas. A narrativa, a capacidade de elaborar histórias as mais mirabolantes, também é legítima nessa busca eterna empreendida pelos escritores de todas as épocas e todas as localidades pela essência do ser humano. Estão aí Borges, Cortázar, Roberto Bolaño, Italo Calvino, Sahrazad, José J. Veiga, Pirandello, Guimarães Rosa e tantos e tantos outros que se acercaram de formas variadas de narrar e ao mesmo tempo refletir sobre a vida. Porque, afinal, escrever é tentar captar e sedimentar algo que é absolutamente fugidio, que é nossa essência.

Tentando explicar coisas inexplicáveis

Você acaba de lançar A Lua de Ur em um Prato de Terra, um livro de contos. Para um escritor, o que significa lançar o seu primeiro livro?


Rilke escreveu um livro que não apenas quem tem pretensões literárias, mas todo ser humano deveria ler. Chama-se Cartas a um Jovem Poeta, onde ele propõe, ao escritor em princípio de carreira, que se pergunte: Eu posso viver sem escrever? Se a resposta for afirmativa, sim, eu posso viver sem escrever, então, desista. Não continue. Caso contrário, não apenas persista como oriente sua vida nesse sentido. Esse livro, que tem o sabor, o cheiro e a ansiedade dos inícios, é essa tentativa de orientar minha vida para a literatura, que precisa de você inteiro, sem concessões. Mas é um primeiro passo rumo a algo que ainda não sei bem o que é.

Publicar um livro provavelmente muda a maneira como as pessoas passam a te ver. Já vi gente que sequer sabia antes que você escrevia, chamando você agora de “escritor”. E quanto a você, muda a maneira como você se vê? Alguma coisa se transforma?

Não. Continuo o mesmo inseguro e esperançoso de sempre, mas dessa vez com um livro a tira colo. Não acredito que vá mudar muita coisa. A não ser pelo fato de que a literatura vai ganhando cada vez mais espaço na vida, como ela merece e como parece ser a via natural das coisas. Mas isso é um caminho até pretendido.
Lançar um primeiro livro é também motivo de insegurança.


O que te embaraça em A Lua de Ur?


O livro é instável, porque provém de momentos diferentes da minha vida. É, antes de tudo, ainda uma tentativa de encontrar uma voz própria, que me seja única e reconhecível. Talvez não tenha conseguido nesse, mas haverá os próximos – como diz Calvino na boca do escritor Silas Flannery, em Se um Viajante numa Noite de Inverno: se penso que estou escrevendo apenas um livro, me inquieto; ao pensar que escrevo uma biblioteca inteira, me aquieto, porque o que não conseguiu ser esgotado em um volume pode vir a ser em outro. Estou tentando escrever uma biblioteca inteira, resumidas em não tantos volumes assim.

Lançamentos normalmente são muito chatos. Eu digo pelo menos para quem vai, se não estiver resguardado de muitos amigos, porque acaba sendo sempre uma reunião muito pessoal(de grupos), por mais cheia que esteja. E pra quem faz o lançamento em si, como é?

Lançamento é coisa chata. Não dá pra conversar com ninguém direito. Afora isso, para mim, ainda há o fato de não conseguir lidar muito bem com publicidade em torno da minha figura. Particularmente no caso de um lançamento em que o que está exposto ali não é a qualidade literária do sujeito – já que o livro ainda ninguém leu – mas o próprio escritor. Entretanto, é a via de se chegar aos leitores, o objetivo final. Mas minha preocupação é com a literatura. Livros efetivamente bons acabam sendo encontrados por um, dois ou cem leitores – independente da divulgação que se tenha feito nele. Carlos Nóbrega, um excelente poeta cearense que não se divulga e praticamente não há indicação de quem ele é em seus livros, é prova viva. A literatura dele vai sobreviver apesar da vida misteriosa do autor, porque tem consistência. A boa literatura sempre viverá.


A Lua de Ur num Prato de Terra - de Alan Santiago (Contos) . Editora 7 Letras. Internet: Livraria Travessa e Livraria Cultura. Ao vivo: Livraria Lua Nova - Av. 13 Maio, 2861 - Benfica, Fortaleza - CE. Telefone: 3214 5488‎.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

E a Madonna nem morreu

É o nome de uma festa em comemoração aos 51 anos da moça que acontece esse sábado no Cine Betão, aqui em Fortaleza, mas poderia muito bem ser uma frase sobre a própria carreira de nossa polêmica unanime Rainha do Pop. Ora, se os tempos de reis e rainhas avassaladores de uma cultura de massa absolutista se foi, e ainda por cima o decapitado Micheal morreu, então, quem sobra? Pois é, Madonna não morreu. Ou morreu?

Sim e não, eis a resposta:



É mais do que clichê, mas não custa repetir o verdadeiro e óbvio: Madonna sobreviveu porque soube se reinventar. Não só musicalmente, mas como performer e como empresária também - alguém duvida que esse seja também um de seus grandes talentos? - como demonstra seu recente reposicionamento no mundo do entretenimentos ao investir em shows como nunca. E ainda em shows aparentemente menos pretensiosos, quer dizer, no sentido de uma certa atmosfera de celebração e brincadeira que há tempos vinha diminuindo em suas apresentações. Como Madonna não é nem nunca foi uma artista do improviso, eis que ele surge aqui roteirizado, mas ainda assim uma ótima sacada.

Em tempos de mp3s e dispersão dos usuários pelas novas mídias (quase ninguém fica mais parado diante da telinha esperando a MTV dizer do que devemos gostar), o ideal talvez seja realmente aproveitar o público que essa própria emissora formou e lucrar loucamente com shows e shows e mais shows.

E isso, talvez, a performance, além do negócio, talvez seja o que Madonna sempre soube mesmo fazer melhor. Outras podem ter mais energia, cantar melhor, serem mais bonitas, mais extravagantes, mais artísticas (Q?), mas Madonna indubitavelmente ainda é a maior performer. Difícil definir o que seja isso, mas basta olhar para a apresentação do VMA em que a cantora se apresenta com Britney e Christina para reparar que seus olhos muito provavelmente se alternarão somente entre Britney e Madonna, e que, apesar de na época já ter quase cinquentinha, cantar uma múscica flopada e estar bem mais vestida, Madonna ainda é a atração da noite.

Mas eis que chegamos em She's not me, que é a música do vídeo acima e o grande motivo - ou pretexto - deste post. Se Madonna ainda está viva, isso quer dizer que várias personas foram morrendo no meio do caminho. I know I can do it better, ela grita, enquanto acaricia os seios cônicos que lhe imortarizam no hall mnemístico da fama na performance mais interessante de sua Stick and Sweet tour, a qual esteve no Brasil e agora ganhou uma segunda parte, fato inédito na carreira da cantora - o que demonstra ainda mais essa vontade de se reiventar.

Como disse Marina Lima em artigo para um jornal que não lembro qual, a popstar não necessariamente tem feito o melhor, mas continua tentando descobrir novos caminhos. O disco Hard Candy, embora extremamente irregular, é justo um esforço nesse sentido, mesmo que estes caminhos passem pelo passado e tentem reencontrar uma Madonna ícone dos anos 80 no meio desse revival oitentista que tem super cara de contemporâneo. Não deu, mas teve seus altos ao reeditar uma certa despretensão da artista que é a cara daquela década, como no hit Give it 2 me, ou na deliciosa Candy Shop, no qual a artista subverte a lógica misógina e extremamente machista da canção homônima do rapper 50 cent.

Na versão de Madonna, a loja de doces não é uma referência fálica, mas uma espécie de jogo irônico com o arquétipo de um grande mãe que tem tudo a oferecer:

See which flavor you like
And I'll have it for you (...)
Don't pretend you're not hundry
There's plenty to eat
C'mon into my store
Cause my sugar is sweet

Com licença para viagens psicanarquétipicas(o blog é meu, dá licença), é possível pensar em uma afirmação de genorosidade, pois ela é "a Rainha", e tem de tudo para oferecer (estilos, atitudes, etc), ao mesmo tempo que essa habilidade de prover reafirma sua própria feminilidade. Como a introdução de She's not me, ''this is for the ladies", uma exibição de força feita de cima de um salto 15.

E as senhoritas no caso, poderiam ser Britney e afins, as quais são derivações madônicas que a própria canibaliza seja ritualmente como no VMA, ou a nível de linguagem, com a apropriação de produtores que levaram Britney ao topo, como Pharrel Williams, responsável por Toxic, mas também por Candy Shop, Give it 2 me e She's not me.

Apesar dessa mensagem mais ou menos subreptícia (adorei descobrir essa palavra e agora vou usá-la agora sempre que puder), a idéia principal está ali, no palco. As 4 dançarinas/estátuas fantasiadas de Madonnas de diversas épocas. Elas ficaram paradas no tempoo, estáticas, mas a Madonna verdadeira, que é sempre a de agora, permanece. Pra onde vai? Deus sabe. Mas Deus sabe também o quanto ela está tentando.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Vida longa, arte efêmera

Diário de uma catita, de Bruna Beserra

Uma xilogravura editada no computador, rugas impressas em tecidos expostos em varais, intervenções urbanas e até mesmo histórias em quadrinhos compõem a diversidade de técnicas, temas e abordagens da exposição De Última Hora, resultado dos trabalhos de conclusão do curso tecnológico em Artes Visuais do semestre 2009.1. do Instituto Federal do Ceará. Ao todo são dez artistas,cujas obras ficam em exposição no Alpendre de 13 a 17 de agosto.

Longe de coesão, os trabalhos apresentados mostram refratam a realidade em suas principais possibilidades de representação. A reflexão sobre o tempo e a memória estão presentes no trabalho de Cecília Shiki, a qual imprimiu fotografias das rugas de sua família e as imprimiu em tecido. Já Bruna Beserra preferiu colocar seus próprios retratos ao dispor dos passantes da rua: nem menos nem mais importante é essa auto-representação do que a curiosidade dos que passam.

YHVH, de Diogo Braga

Diogo Braga, por sua vez, continua sua pesquisa sobre a iconografia religiosa através de uma apropriação criativa e não menos poderosa ao criar um vídeo que apresenta uma criatura com ares de santa católica envolta em uma atmosfera de medo como de uma Samanta, a menina-fantasma de o chamado, em uma versão esdruxulamente católica. Ainda entre outros destauqes, temos o aprofundamento da pesquisa de um dos membros do grupo Acidum(o qual mantém seu anonimato) sobre grafite, intervenção urbana e as maneiras de encarar a loucura.

SERVIÇO: De Última Hora, exposição com os trabalhos de conclusão de curso dos alunos do IFCE. No Alpendre - Casa de Arte, Pesquisa e Produção (Rua José Avelino, 495 - Praia de Iracema). Grátis. Informações: 3219 2362.