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segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Quando fala o coração do filho-diretor

Mais do que uma biografia ou homenagem, ‘’Maysa, quando fala o coração’’ parece ser um acerto de contas sentimental do diretor Jayme Monjardim com a cantora, sua mãe. Enorme sucesso no final da década de 50, Maysa largou o casamento com André Matarazzo, um dos homens mais ricos de São Paulo, assim como o filho que teve com ele, o próprio Jayme.

Motivação mais familiar seria impossível, o que por si só não impediria uma bela tentativa de resgate afetivo da memória. É uma pena, porém, que ao fazê-lo o diretor pareça trocar o sentimento - e quando se fala da cantora este é um pecado gravíssimo - pelo mero sentimentalismo.


Em vez de contar uma história, as imagens aqui tratam de ser sublinhas, seja pelo texto por demais pedagógico, as elipses mal colocadas e repetitivas ou a trilha sonora redundante, tudo, no final, uma grande redundância. O que resta de obra, no final, é só a superfície.

Brilhante, sempre, é verdade: uma fotografia esplendorosa, reconstituição de época idem. Segundo o site da minissérie, boa parte dos vestidos usados ou são da própria Maysa, ou são baseados em modelos que a própria usou. Tudo extremamente bem feito e apurado, mas tanta produção que parece esquecer que além de belo tudo aquilo deveria ter ao menos vida.

Um exemplo é a atriz-reencarnação de Maysa, Larissa Maciel, que foi escolhida entre mais de 1000 meninas para literalmente encarnar a cantora. De tão assustadoramente parecida com a intérprete de Tarde Triste, o próprio espectador que conhece minimamente a artista é levado por alguns instantes a esquecer que ela tem que atuar. Mas o engano não persiste, a não ser no diretor, que parece realmente muito mais disposto a tentar fazer uma morta andar e falar do que ajudar a atriz a construir uma personagem. E é isso que ela faz, imita Maysa. No final, somente uma caricatura.

Seria injusto, porém, responsabilizar somente a atriz pela má qualidade da minissérie. Talvez seja ela o menor dos problemas, assim como as atuações, todas bastante engessadas. Por um lado, tratam-se dos anos 50, e Maysa realmente deveria pronunciar muito bem os erres de cada palavra, porque era moça de família e cantora de dicção perfeita. André Matarazzo, por sua vez, que de tão duro parece saído diretamente de um intensivo de RPG(Reeducação Postural Global) de 10 anos, talvez também fosse austero como representado na telinha. Mas é uma pena que, para além do gesso da época, eles pareçam simplesmente ocos.

Primeiro porque o texto de Manoel Carlos, o artífice dos cotidianos milimetricamente espontâneos simplesmente não consegue lidar com as frases de efeito disparadas a toda hora pela boca de Maysa, que falava assim mesmo, basta ler suas entrevistas. Na vida real, entretanto, conseguia soar autêntica, coisa que quase nunca acontece aqui.


A fotografia, apesar de exuberante com suas cores saturadas, enquadramentos e luz cinematográfica, também não consegue fazer a coisa deslanchar. Pelo contrário, o diretor não se entregar a história da personagem, cheia de cenas – no sentido teatral mesmo, porque Maysa é teatral em todos os sentidos - e fatos interessantes. Pelo contrário, prefere mostrar o óbvio, usar jogos de mis en cene esquemáticos. Apega-se a cenas clichês como a da noiva entrando no altar ou a despedida dramática dos pais da filha que dali a pouco sofreria um acidente fatal. Enfim, um exagero usado para contar uma história que já continha por si só cores fortes.

E talvez a história de Maysa só pudesse ser contada assim mesmo, de maneira kitsch, reflexo de sua própria persona. Se a ambientação ou a fotografia vez ou outra remete à um Amor à Flor da Pele, de Wong Kar Wai, que usa a exacerbação de recursos pra acompanhar com paixão a própria paixão dos personagens, imagem e representação parecem totalmente descolados no caso da tele-biografia.

Uma pena, pois, visto que a minissérie é baseada no livro escrito por Lira Neto, Maysa, Só numa multidão de amores, que cumpre a missão de contar a história com certa objetividade sem deixar de torná-la deliciosa. Feliz, porém, que a minissérie, apesar de tudo, possa ajudar a recuperar a memória da escritora, nossa diva sofredora dos palcos, como define Marina de la Riva, hoje em dia tão injustamente esquecida.

Um comentário:

Anônimo disse...

realmente
a maneira como retrataram a Maysa fez com que ela parece totalmente irresponsavel, minha mãe ficou dizendo que ela era só uma boêmia.
muitas pessoas não exergam ela como artista e talentosissíma.

mas em relação a atuação, fiquei intrigada, então se o ator tentar encarnar o personagem ao maximo, tipo, como ela fez, é um erro?

já assisti filmes biográficos como Control sobre o Ian Curtis em que fiquei mais impressionada foi com a semelhança do ator na atuação e fisicamente.