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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Deixa ela entrar, de Tomas Alfredson


Se a figura do vampiro já foi encarnada por criaturas monstruosas, lordes galantes e mais recentemente como inofensivos e castos adolescentes da geração emo, Deixa ela entrar traz uma abordagem fresca e nem por isso menos fiel à mitologia vampiresca que tanto fascina o ocidente. O que está posto dessa vez é um drama e um romance pré-adolescente contado com doçura, mas nem por isso abandonando o caráter obscuro do mito.

Dessa vez o protagonista é Oskar, garoto recluso e tímido vítima de bullying na escola. Já Eli, sua vizinha, é uma vampira que sobrevive às custas dos assassinatos cometidos por Håkan, que retira o sangue de suas vítimas para servi-lo como alimento para Eli.

Faz tempo que queria escrever sobre Deixa ela entrar, mas só agora que comecei a ilustrar os posts desse blog com pôsteres, em vez de imagens dos filmes, tive uma idéia mais clara de que caminho abordar.

Trata-se de um filme de terror. Esse é o ponto do qual eu gostaria de partir, e o pôster acima, mais do que qualquer outro usado como divulgação, deixa isso bastante claro. Se a versão brasileira do cartaz (bem parecida com a americana) deixa apenas a imagem fantasmagórica da vampirinha Eli como indício do teor sobrenatural do filme, o cartaz original (acima), explicita a violência e sua ligação com o relacionamento entre os dois jovens: acima de tudo, como uma sombra onipotente, paira Eli; Oskar, garoto aparentemente inocente, mas com sede de vingança, está localizado mais ou menos perto de seu coração, enquanto no primeiro plano, o mais baixo, temos o corpo suspenso de uma das vítimas de Håkan.

Os três elementos atingem uma relação íntrinseca que perpassa toda a narrativa. A aproximação do casal mirim, por exemplo, ocorre apenas quando a vampira assiste o garoto esfaquear uma árvore enquanto verbaliza seu ódio contra seus agressores na escola. E é de certa forma através da relação entre a impotência do garoto e os poderes sobrenaturais de Eli que se constrói a atração entre eles e mesmo a empatia do espectador com o relacionamento dos dois. Eli deseja protegê-lo, e Oskar, indefeso, agradece essa proteção.

Ou não seria tão simples assim? Afinal, o que provavelmente a vampira precisa é de alguém que cumpra o papel de seu guardião, visto que ela não pode sair na rua durante o dia, nem expor-se tanto sozinha assassinando os vizinhos sem levantar alguma suspeita. O que o filme leva a crer, portanto, é que Oskar em breve assumirá o papel do serial killer companheiro de Eli, e os dois sobreviverão, sabe até quando, com essa parceria.

É claro que não é apenas o puro desejo ou potência de violência que junta os dois personagens. Eli é provavelmente tão excluída quanto Oskar, e também não teve culpa da violência à qual foi submetida (ter sido transformada em vampira ainda quando criança), como o garoto não tem do bullying que sofre na escola. Oskar tem pais separados e uma mãe aparentemente pouco presente; Eli sequer pais possui. Ambos estão, portanto, sozinhos no mundo. Mas o que sela o seu relacionamento é o desejo de vingança, ou ao menos de sobrevivência em um mundo cada vez mais marcado pela violência.

Poderia falar sobre muitos outros aspectos do filme, especialmente o cuidado visual, a maneira como Alfredson reatuliza os clichês do vampirismo, matendo-se fiel a muitas de seus elementos característicos, mas de maneira sóbria e bastante arrojada. A fotografia, efeitos especiais e direção de arte do filme são um deslumbre à parte, e provavelmente apenas ajudam a levantar o incrível jogo de sedução armado pela história, por Eli e talvez até pelo próprio cinema em relação à nós, supostamente tão incautos espectadores.

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